“Há quem queira acreditar que a palavra forró vem do inglês “for all” (para todos). Tudo bem, quem quiser acreditar que acredite, mas pra mim isso é conversa pra boi dormir. Só falta dizer que foram os ingleses que inventaram o forró.
Quando eles chegaram ao Brasil, com a Great Western, para construir estradas de ferro, no início do século XVIII, o forrobodó já existia, assim como o pagode, o samba e o arrasta-pé – que eram expressões para designar as festas populares movidas à música, dança e aguardente. O forrobodó, por ser uma palavra nascida no Nordeste, foi que deu origem à palavra forró. O primeiro registro data de 1733, num jornal chamado O Mefistófolis (o satanás), no número 15: “Parabéns ao Dr. Artur pelo grande forró realizado em sua casa…” .
A construção das estradas de ferro no Nordeste deu origem, também, a algumas palavras do nosso vocabulário como baitola, que vem de bitola; sulipa (“dei uma sulipa nele”), vem de sliper (dormente) e algumas outras que não me recordo agora.
O forró também não é um gênero de música, como muitos acham. Se observarmos um disco de forró, por exemplo, vamos encontrar vários gêneros musicais como côco, xote, xaxado, marchinhas, baião etc. Forró é o coletivo da musicalidade popular do nordestino, a junção da música que vem da sanfona, da zabumba e do triângulo, originalmente, com a cachaça e a dança. Se você diz: “vai ter forró lá em casa”, todo mundo vai ficar sabendo que a festa vai ser legal.
Vários artistas fizeram e fazem sucesso cantando e tocando essa música alegre e contagiante: Luís Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Almira Castilho, Marinês e sua Gente, Trio Nordestino, Jacinto Silva, Toinho de Alagoas, Biliu de Campina, Edmílson do Pífano, Dominguinhos, Cascabulho, Elba Ramalho etc. E vão surgir muitos outros, pois o forró é uma música verdadeira, que fica.
Entra moda, sai moda e o forró tá lá (não confundir com o forró brega que vem do Ceará como Mastruz com Leite, Cavalo de Pau e outras do gênero – que só tem o mérito de empregar vários músicos, bailarinos e técnicos num show de puro entretenimento).
Pra mim, o forró mais gostoso de se ouvir é o pé-de-serra instrumental; cada vez mais raro, pois nos lugares aonde chegava para fazer shows Luiz Gonzaga era muito procurado por sanfoneiros os quais, pra mostrar serviço, tocavam Tico-Tico no Fubá, Brasileirinho e outras similares, cheias de notas e de difícil execução. Seu Luiz olhava pra eles e dizia: “Sanfoneiro que não canta, não ganha dinheiro nem mulher”. Essa postura influenciou muitos músicos bons. Dominguinhos é um exemplo. Pra mim isso é errado, pois esses instrumentistas tocam bem, mas cantam mal.
Por outro lado, há aqueles que ainda dão mais ênfase ao forró instrumental quando gravam um disco. É o caso do grande sanfoneiro Duda da Passira. É comum nos discos de Duda encontrar apenas uma música cantada (normalmente, a última); todas as outras são instrumentais. Quando produzi o disco de Edmílson do Pífano, tive o cuidado de não o deixar cantar. Minha intenção era mostrar ao público a sua verdadeira arte: o dom de tocar aquele canudinho de bambu.
Grande parte da sociedade ainda não assimilou o forró. Acham que é música de pobre, de gentinha, que sanfona é instrumento de cego e coisas assim. Porém, não sabem o que estão perdendo. O forró é a dança mais sensual que já vi em minha vida. Aquele bate-coxa enlouquece qualquer um; a música é alegre, ritmada e contagiante.”
* Zé da Flauta é músico, produtor e coordenador musical da Fundação de Cultura Cidade do Recife (Fonte)