Texto – O Psicodelismo na vida de Zé Gonzaga – por Abílio Neto
No fim da década de 60, mais precisamente em 1967, o cantor, compositor e sanfoneiro Zé Gonzaga gravou um disco que deu muito o que falar: o álbum PSICODÉLICO.
PSICODÉLICO é também o título da principal música do LP. Mas por que houve tanta estranheza no mundo do forró?
1) Todo forrozeiro, inclusive seu irmão Luiz Gonzaga, detestava a Jovem Guarda com aquele órgão de Lafayette principalmente no ritmo do iê-iê-iê;
2) O título daquele LP e daquela música dava a entender que Zé Gonzaga a compôs em estado de alucinação mental produzido pelo efeito de alguma droga?
3) Estaria Zé Gonzaga querendo subverter o baião com aquele lá-lá-lá-lá-lá-lá-lá-lá impróprio, aquela letra então dita cafona e aquele teclado substituindo a sanfona?
Além disso, o cantor que ele convidou para cantar a música no seu disco não era um forrozeiro. Paulo Tito era um seresteiro. É verdade que pegava algum arrego no forró.
Absolutamente verdadeiro é que, na época que o disco saiu, em qualquer loja de disco que a gente chegasse como cliente conhecido, o vendedor logo perguntava: você já conhece o novo LP de Zé Gonzaga? E aí chamava a atenção para o nome do disco. E realmente era estranho!
Diante de tantas estranhezas dos consumidores de forró, o psicodelismo de Zé Gonzaga só durou cinco anos porque em 1972, aí sim, ele próprio gravou PSICODÉLICO, acompanhado da sua sanfona, mas fazendo uma alteração drástica no nome da música: passou para SONHO LINDO. E aí, sem querer, tirou toda a poesia e mistério que se escondia por baixo do antigo título.
Para mim, aquilo ali foi uma espécie de movimento contracultural de Zé Gonzaga porque ele continuou a produzir seus baiões românticos ou bregas até o fim da década de 60. No disco comentado há mais uns dois. Ele quis chamar a atenção de que a JOVEM GUARDA estava acabando com o forró. Esse é meu entendimento.
Tanto foi de ação de contracultura do baião seu gesto que, em 1986, o cantor Oseas Lopes, o Oseínha, do antigo Trio Mossoró, que virou cantor brega com o nome Carlos André, o regravou com o nome BAIÃO PSICODÉLICO e não como SONHO LINDO. E ainda teve a audácia de introduzir um nome como parceiro de Zé Gonzaga, com o fim, é claro, de ganhar direitos autorais. Aliás, o codinome que ele introduziu acabou dando fim ao mistério de quem seria o verdadeiro Zé Mocó, parceiro de tantos compositores no mundo do forró. Psicodélico sempre foi de autoria de Zé Gonzaga, sozinho. E fim de papo, não é, Oseínha!
Resumindo tudo: aquilo que Zé Gonzaga relutou em registrar como BAIÃO PSICODÉLICO, Carlos André escancarou de vez em 1986. E Zé Gonzaga fugia tanto disso, foi incomodado tanto por isso, que em 1972 o regravou editando no selo do LP que a música era um samba. Só que de samba não tem nada. Qualquer um percebe isso. Não é preciso ser músico para tal.
E assim caminha a Humanidade, cheia de contradições, mas por vários motivos o LP PSICODÉLICO, de Zé Gonzaga, tornou-se icônico na sua carreira, principalmente pela gravação exclusiva (até hoje) da música do seu irmão Luiz Gonzaga: o notável baião SENTIMENTAL, mas o disco continua sofrendo boicote inexplicável do maior site de divulgação de forró no Brasil: o FORRÓ EM VINIL. Eu lamento!
Não entendo a restrição porque até Carlos André com seu romantismo exagerado está lá, mas Zé Gonzaga, com esse disco comentado aí acima, não pode. Zé era conhecido por sua alegria e sua zoada. Foi esquecido até no seu centenário em 15/01/2021, mas não o será por ocasião da passagem dos 20 anos da sua morte. Então, descanse em paz, Zé, mesmo com uma zoada dessa! (Abílio Neto)